Tendências Futuro Inovação
2 Maio 2023

O Futuro da Realidade Virtual no Turismo e Imobiliário em Portugal

Joana Almeida

Responsável de Marketing, Portugal VR Tours

À medida que entramos na segunda década do século XXI, a realidade virtual (VR) deixou de ser uma curiosidade tecnológica para se tornar uma ferramenta transformadora em diversos setores. Em Portugal, os setores do turismo e imobiliário estão na vanguarda desta revolução, com inovações que prometem redefinir completamente como experienciamos os espaços e os lugares. Este artigo explora as tendências emergentes e projeta o futuro da realidade virtual em Portugal, analisando o seu potencial para transformar estes setores vitais da economia portuguesa.

A Convergência das Tecnologias Imersivas

Um dos desenvolvimentos mais significativos no horizonte próximo é a crescente convergência entre diferentes tecnologias imersivas. Enquanto atualmente tendemos a separar realidade virtual (VR), realidade aumentada (AR) e realidade mista (MR), os próximos anos deverão testemunhar uma fusão destas tecnologias em experiências mais integradas e fluidas.

Em Portugal, empresas como a Immersive Labs Lisboa e o Centro de Investigação em Tecnologias Imersivas da Universidade do Porto estão a desenvolver plataformas que combinam:

  • Tours virtuais imersivos com elementos de realidade aumentada sobrepostos
  • Capacidade de alternar fluidamente entre modos imersivos totais e visões aumentadas da realidade
  • Interfaces hápticas que adicionam sensações táteis às experiências visuais
  • Áudio espacial avançado que replica com precisão as características acústicas dos ambientes

Estas tecnologias convergentes permitirão, por exemplo, que um potencial comprador de imóveis explore virtualmente uma propriedade enquanto simultaneamente acede a dados sobrepostos sobre características específicas, histórico de preços do bairro, ou visualiza diferentes opções de mobiliário e decoração em tempo real.

Democratização e Acessibilidade

Um dos entraves históricos à adoção generalizada da realidade virtual tem sido o custo e a complexidade dos equipamentos necessários. No entanto, estamos a assistir a uma rápida democratização desta tecnologia em Portugal, impulsionada por:

  • Dispositivos VR mais acessíveis e independentes (que não requerem computadores potentes)
  • Aumento da disponibilidade de experiências VR baseadas em navegador, que funcionam em smartphones comuns
  • Quiosques e espaços públicos com experiências VR acessíveis à população geral
  • Bibliotecas de conteúdo partilhado e ferramentas de criação mais simples

O Ministério da Economia português, através do programa "Portugal Digital", já sinalizou a intenção de criar uma rede nacional de centros de experiência VR em postos de turismo e espaços públicos, permitindo que cidadãos e visitantes de todas as idades e contextos socioeconómicos possam aceder a estas tecnologias.

"O futuro da realidade virtual em Portugal não é apenas uma questão de avanço tecnológico, mas também de inclusão digital. Queremos garantir que estas ferramentas transformadoras estão acessíveis a todos os portugueses e a todos os que desejam explorar o nosso país, independentemente da sua literacia tecnológica ou capacidade económica."
— Dr. Manuel Costa, Coordenador do Programa Portugal Digital

Turismo Virtual como Complemento, Não Substituto

Um mito que tem persistido sobre o turismo virtual é que ele poderia eventualmente substituir as viagens físicas. A experiência portuguesa, no entanto, está a demonstrar precisamente o contrário: o turismo virtual funciona como um poderoso complemento e catalisador para experiências físicas.

Nos próximos cinco anos, prevemos o desenvolvimento de:

  • "Pré-turismo" virtual que permite aos viajantes planear experiências personalizadas antes da chegada
  • Camadas virtuais que enriquecem visitas presenciais com contexto histórico e cultural
  • Experiências "alargadas" que permitem aos visitantes explorar áreas normalmente inacessíveis
  • "Pós-turismo" que permite reviver e partilhar experiências após o regresso a casa

Projetos-piloto em Évora e Sintra já estão a experimentar com estas abordagens integradas, onde a experiência turística começa virtualmente semanas antes da viagem física, continua in loco através de dispositivos de realidade aumentada, e estende-se após o regresso do visitante através de plataformas de realidade virtual que permitem "revisitar" os locais descobertos.

Imobiliário: Da Visualização à Simulação

No setor imobiliário, a próxima grande evolução será a transição de simples visualizações estáticas para simulações dinâmicas e interativas. As próximas gerações de tours imobiliários virtuais permitirão:

  • Simulações de luz natural ao longo do dia e em diferentes estações do ano
  • Simulações acústicas que permitem experimentar os níveis de ruído e privacidade sonora
  • Modificações virtuais em tempo real (alteração de plantas, remoção de paredes, reconfiguração de espaços)
  • "Habitação temporária virtual" para experimentar como seria viver no espaço por períodos prolongados

Empresas portuguesas como a TechHabitar e a VRPropriedade estão a investir fortemente em I&D nestas áreas, com o objetivo de criar "gémeos digitais" completos de propriedades que reflitam não apenas a aparência visual, mas todas as qualidades experienciais e funcionais dos espaços.

Social VR: Experiências Partilhadas

Uma das limitações atuais da realidade virtual é a sua natureza frequentemente solitária. No entanto, as tecnologias de "Social VR" estão a evoluir rapidamente e prometem transformar como experienciamos espaços virtuais em contextos sociais.

No contexto português, isto traduzir-se-á em:

  • Tours virtuais de grupo, onde famílias ou grupos de amigos geograficamente dispersos podem explorar destinos portugueses juntos
  • Visitas imobiliárias virtuais acompanhadas por agentes em tempo real, com interação bidirecional
  • Eventos culturais virtuais em réplicas de locais históricos portugueses
  • Experiências de aprendizagem colaborativa em ambientes patrimoniais virtuais

O Festival de Realidade Virtual de Lisboa já anunciou para 2024 o lançamento da primeira plataforma de Social VR especificamente dedicada ao património cultural português, permitindo que pessoas de todo o mundo possam explorar colaborativamente locais como o Mosteiro dos Jerónimos ou a Universidade de Coimbra acompanhados por guias virtuais ou por amigos e familiares.

Preservação Digital do Património

Portugal possui um rico património cultural e arquitetónico, algumas partes do qual enfrentam desafios de preservação ou acessibilidade. A realidade virtual está a emergir como uma importante ferramenta de preservação digital deste património.

Projetos em desenvolvimento incluem:

  • Reconstruções virtuais completas de monumentos em risco ou parcialmente degradados
  • Preservação de tradições culturais imateriais através de capturas volumétricas
  • Arquivos digitais imersivos que documentam alterações aos locais ao longo do tempo
  • Recriações de eventos históricos em locais patrimoniais

A Direção-Geral do Património Cultural lançou recentemente o "Arquivo Digital Imersivo", uma iniciativa ambiciosa que visa criar réplicas virtuais de alta fidelidade dos principais monumentos nacionais, não apenas para fins turísticos, mas como verdadeiros repositórios digitais para fins de pesquisa, preservação e educação.

Sustentabilidade e Ética Virtual

À medida que a realidade virtual se torna mais integrada no turismo e imobiliário, questões de sustentabilidade e ética estão a ganhar relevância. O futuro deverá incluir uma reflexão consciente sobre:

  • Utilização da VR para promover formas de turismo mais sustentáveis e menos massificadas
  • Transparência e honestidade nas representações virtuais de propriedades e destinos
  • Acessibilidade universal das experiências virtuais para pessoas com diferentes capacidades
  • Proteção de dados e privacidade em ambientes virtuais cada vez mais sofisticados

A Associação Portuguesa de Turismo Responsável está a desenvolver, em colaboração com a Portugal VR Tours e outras empresas do setor, o primeiro "Código de Ética para Turismo Virtual" que estabelecerá diretrizes para garantir que o desenvolvimento desta tecnologia respeite valores de integridade, inclusão e responsabilidade ambiental.

Integração com Inteligência Artificial

Um dos desenvolvimentos mais promissores no horizonte é a crescente integração entre realidade virtual e inteligência artificial, permitindo experiências mais personalizadas e adaptativas.

Em Portugal, várias iniciativas estão a explorar:

  • Guias virtuais alimentados por IA que respondem a perguntas específicas sobre destinos ou propriedades
  • Personalização dinâmica de experiências virtuais baseada em preferências e interesses do utilizador
  • Simulações realistas do movimento de pedestres e tráfego em tours urbanos virtuais
  • Tradução automática e contextual em tempo real para tornar o património cultural português acessível a visitantes internacionais virtuais

O Laboratório de Inteligência Artificial da Universidade de Lisboa está a colaborar com operadores turísticos e imobiliários para desenvolver o "Cicerone Virtual" - um sistema de IA capaz de personalizar completamente uma visita virtual baseada não apenas em preferências explícitas, mas também em reações implícitas capturadas durante a experiência.

Desafios Regulatórios e Normativos

Com a crescente importância destas tecnologias, o ambiente regulatório e normativo também terá de evoluir. Nos próximos anos, Portugal provavelmente necessitará de desenvolver:

  • Enquadramentos específicos para representações virtuais de propriedades no contexto imobiliário
  • Proteções para consumidores relativas à precisão e fiabilidade das experiências virtuais
  • Considerações de direitos autorais para recriações virtuais de monumentos e patrimónios protegidos
  • Normas técnicas para garantir interoperabilidade entre diferentes plataformas e serviços

A Entidade Reguladora para a Comunicação Social já indicou interesse em expandir o seu âmbito para incluir experiências imersivas, reconhecendo o crescente papel da realidade virtual como meio de comunicação e o seu potencial impacto social e cultural.

Conclusão: Um Futuro Português em Realidade Virtual

À medida que olhamos para o futuro, torna-se claro que a realidade virtual não é apenas uma tendência passageira, mas uma transformação fundamental na forma como interagimos com espaços, lugares e experiências. Para Portugal, um país que depende significativamente do turismo e cujo mercado imobiliário tem uma crescente dimensão internacional, o domínio destas tecnologias representa tanto uma oportunidade económica como cultural.

As inovações dos próximos anos não se limitarão a melhorar as tecnologias existentes, mas reconfigurarão fundamentalmente a relação entre espaços físicos e virtuais, entre experiências locais e globais, e entre o património tradicional e as possibilidades digitais.

Portugal, com a sua rica herança cultural, paisagens diversificadas e crescente ecossistema tecnológico, está bem posicionado para ser não apenas um beneficiário desta revolução virtual, mas um dos seus líderes globais - criando uma versão virtual do país que complementa e enriquece a sua realidade física, tornando as maravilhas de Portugal acessíveis a todos, onde quer que estejam.